Homem chora abraçado ao corpo do filho morto em atentado na
cidade síria de Aleppo (Foto: Manu Brabo/AP)
A
GUERRA CIVIL NA SÍRIA
Escrito por Carla Mereles/Portal
Politize!
A ONU considera que a guerra civil na
Síria é a maior crise humanitária do século XXI. Hoje, estima-se que o conflito
vitimou ao menos 250 mil pessoas, que mais de 4,5 milhões tenham saído do país
como refugiadas e que outros 6,5 milhões foram obrigadas a se deslocar dentro
da Síria. Com a economia em frangalhos, quase 70% dos sírios que permaneceram
agora vivem abaixo da linha de pobreza. Como começou tudo isso?
Março de 2011 na Síria. Um grupo de
crianças em Daraa, no sul da Síria, pichou frases com críticas ao governo, e
foi preso. Inconformadas, centenas de pessoas saem às ruas da cidade para
protestar contra as restrições à liberdade promovidas pelo governo do ditador
Bashar Al-Assad. Num primeiro momento, simpatizantes dos que se rebelaram
contra o governo começaram a pegar em armas – primeiro para se defender e
depois para expulsar as forças de segurança de suas regiões. Esse levante de
pessoas nas ruas, lutando por democracia, faz parte de um movimento chamado
Primavera Árabe e podemos dizer que esse processo culminou no início da guerra
civil na Síria.
O
QUE FOI A PRIMAVERA ÁRABE?
A chamada primavera árabe foi um
fenômeno que aconteceu em países do Oriente Médio e do norte da África, em que
pessoas – principalmente os jovens – tomaram as ruas pedindo liberdade de
expressão, democracia e justiça social. Essas revoltas foram esperançosas para
grande parte desses países, que eram ditaduras longevas – e, de fato,
presidentes do Egito, da Tunísia, da Líbia caíram.
Porém, cinco anos depois do início dessa
primavera, pode-se dizer que o único caso de “sucesso” foi o da Tunísia, onde
ocorreram eleições diretas, foi aprovada a Constituição mais progressista do
mundo árabe e se elegeu um novo governo. No resto dos países, esse clima de
tensão acirrou as disputas de poder entre milícias e favoreceu a expansão de
grupos terroristas. Isso deu espaço a governos ainda mais autoritários que os
anteriores.
COMO
A GUERRA CIVIL NA SÍRIA SE INTENSIFICOU?
Após a represália do governo de Assad
contra os jovens que estavam se rebelando contra o regime, alguns grupos foram
formados a fim de combater, de fato, as forças governamentais e tomar o
controle de cidades e vilas. A batalha chegou à capital, Damasco, e depois a
Aleppo em 2012. Mas desde que começou, a guerra civil na Síria mudou muito.
O Estado Islâmico aproveitou o vácuo de
representação por parte do governo, a revolta da sociedade civil e a guerra
brutal que acontece na Síria para fazer seu espaço. Foi conquistando territórios
tão abrangentes, tanto na Síria como no Iraque, que proclamou seu ‘califado’ em
2014. Para isso, tiveram de lutar contra todos: rebeldes, governistas, outros
grupos terroristas – como se tivessem feito uma guerra dentro da guerra.
Há evidências de que todas as partes
cometeram crimes de guerra – como assassinato, tortura, estupro e
desaparecimentos forçados. Também foram acusadas de causar sofrimento civil, em
bloqueios que impedem fluxo de alimentos e serviços de saúde, como tática de
confronto.
Agentes
externos: EUA x Rússia
Pelo avanço do Estado Islâmico no ganho
de territórios, os Estados Unidos fizeram ataques aéreos na Síria em tentativa
de enfraquecê-lo, evitando ataques que pudessem beneficiar as forças de Assad –
isso em 2014. Em 2015, a Rússia fez o mesmo contra terroristas na Síria, mas
ativistas da oposição dizem que os ataques têm matado civis e rebeldes apoiados
pelo Ocidente.
O resumo da obra em termos de apoio é
esse: a Rússia e os Estados Unidos querem o fim do Estado Islâmico. Porém, os
Estados Unidos querem a queda do governo de Bashar Al-Assad – por considerarem
que seu regime não democrático é prejudicial à Síria – e, por isso apoia os
rebeldes; por outro lado, a Rússia acredita na força de Assad e está apoiando
seu regime. A Síria, então, é o território do fogo cruzado dessa guerra fria.
GRUPOS
ENVOLVIDOS NO CONFLITO DA SÍRIA
GOVERNO
SÍRIO E ALIADOS
O governo sírio é liderado pelo ditador
Bashar Al-Assad. Ele é sucessor de uma família que está no poder desde 1970. O
regime no país era brutal com a população, de partido único e laico – apesar de
a família Assad ser alauita, ele não é religioso, de acordo com o Estadão.
Apesar de não apoiarem o ditador, cristãos, xiitas e até parte da elite sunita
preferem ver Assad no poder diante da possibilidade de ter um país tomado pelos
extremistas.
Quanto às alianças externas, Assad conta
com o apoio do Irã e do grupo libanês Hezbollah. Juntos eles formam um “eixo
xiita” – ou seja, seguem essa interpretação da religião islâmica – no Oriente
Médio. O grupo se opõe a Israel e disputa a hegemonia no Oriente Médio com as
monarquias sunitas, lideradas pela Arábia Saudita. O principal aliado de fora é
a Rússia, que mantém uma antiga parceria com a Síria. Tanto o apoio do
Hezbollah e das milícias iranianas, quanto os bombardeios mais recentes
realizados pelas forças russas têm sido fundamentais para a sobrevivência do regime
de Assad e o seu recente fortalecimento no conflito.
GRUPOS
REBELDES
Uma das primeiras forças internas que se
rebelou contra o governo sírio foram os grupos sunitas, que se opunham a Assad,
que é xiita. Os sunitas têm dezenas de ramificações e ideologias, mas unem-se
com o princípio básico de derrubar Assad. São chamados de “rebeldes moderados”,
por não serem adeptos do radicalismo islâmico. A maior expressão entre eles é o
Exército Livre da Síria (ELS). A organização está envolvida com países da
Europa e com os Estados Unidos com o objetivo de derrubar o governo de Assad.
Três grandes potências no Oriente Médio também colaboram com os rebeldes:
Turquia, Arábia Saudita e Catar, relevando os interesses dos países próximos à
Síria, também.
EXTREMISTAS
ISLÂMICOS
Entre os grupos que querem derrubar
Assad, há também facções extremistas islâmicas, que estão fragmentadas em
diversos grupos. Uma das organizações que mais conquistaram terreno,
principalmente nos primeiros anos do conflito, foi a Frente Al-Nusra, um braço
da rede extremista Al Qaeda na Síria. Posteriormente, a partir de 2013, o grupo
terrorista Estado Islâmico (EI) aproveitou-se da situação de caos criada pela
guerra civil e, vindo do Iraque, avançou de forma avassaladora e brutal,
ocupando metade do território sírio. Em 2014, o E.I. dominou algumas áreas na Síria e no Iraque,
as quais chamou de califados – o termo se refere aos antigos impérios islâmicos
depois de Maomé, que seguiam rigorosamente as leis islâmicas. É considerada a
organização terrorista mais poderosa e perigosa no mundo hoje.
CURDOS
Os curdos são uma etnia apátrida (sem
Estado e território próprios) de 27 a 36 milhões de pessoas. Eles vivem em
diversos países, inclusive na Síria, e reivindicam a criação de um Estado para
o seu povo – o Curdistão. Desde o início do conflito na Síria, uma
milícia chamada Unidade de Defesa Popular foi formada para defender as regiões
habitadas pelos curdos no norte do país e se fortaleceu tanto que hoje tomou
conta de um grande território perto da fronteira turca. Para o regime de Assad,
tornaram-se bastante úteis, porque a milícia se opõe tanto aos rebeldes
moderados como aos extremistas do Estado Islâmico.
O
FORTALECIMENTO DO REGIME SÍRIO COM A RETOMADA DA CIDADE ALEPPO EM 2016
Um dos episódios mais importantes e
marcantes dos seis anos de conflito na Síria foi a retomada da cidade de
Aleppo, em 2016, por meio de uma operação militar do ditador sírio Bashar
Al-Assad. A cidade é a segunda mais importante do país depois da capital
Damasco e a mais populosa, localizada ao norte, a 60 quilômetros da fronteira
com a Turquia.
Como foi a retomada de Aleppo por Assad?
No início da guerra, os rebeldes moderados dominaram o lado oriental da cidade,
onde aconteciam os embates com o governo, que continuava controlando o lado
ocidental. Em meados de 2016, Assad mobilizou tropas militares juntamente com
seus aliados – a Rússia, o Irã e a milícia libanesa Hezbollah – a fim de
desestabilizar a sua oposição. Dezenas de aviões russos bombardeavam redutos –
locais estratégicos – dos rebeldes e mataram milhares de pessoas dentre a
população; enquanto isso, o exército sírio, militares da Guarda Revolucionária
do Irã e combatentes do Hezbollah avançaram por terra.
A retomada de Aleppo foi imprescindível
para o fortalecimento do governo sírio porque era uma das últimas grandes
cidades ainda sob o controle dos grupos opositores e também porque era o local
onde os opositores do regime pretendiam instalar uma “capital” da Síria
anti-Assad.
Em meados de 2017, o governo sírio está
em vantagem perante os outros grupos envolvidos no conflito. Logo após a
retomada de Aleppo por Assad, os rebeldes e o governo sírio fizeram um acordo
de cessar-fogo que foi constantemente violado por ambas as partes. Essa medida,
porém, permitiu que a ajuda humanitária chegasse até o local e retirasse os
civis das áreas mais afetadas pela guerra. Mas, como esse acordo foi
fragilmente concebido, em janeiro de 2017, os rebeldes desfizeram o cessar-fogo
estabelecido.
Fonte: http://www.politize.com.br
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