AGRICULTURA
SUSTENTÁVEL
Eduardo
Ehlers*
A insatisfação com os graves impactos
ambientais provocados pela agricultura moderna vem estimulando a busca de uma
agricultura mais sustentável. O que se quer são sistemas produtivos que,
simultaneamente, conservem os recursos naturais e forneçam alimentos mais
saudáveis, sem comprometer os níveis de produção já alcançados.
Existem dezenas de definições para se
explicar o que é agricultura sustentável. Deixando de lado as nuanças, pode-se
dizer que todas transmitem a ideia de um sistema produtivo que garanta:
manutenção, a longo prazo, dos recursos naturais e da produtividade agrícola; o
mínimo de impactos adversos ao ambiente; otimização da produção com um mínimo
de insumos externos; satisfação das necessidade humanas de alimentos e renda; atendimento
às necessidades sociais das famílias e das comunidades rurais.
A noção de agricultura sustentável se
espalhou, no final do século passado, por várias partes do Planeta, ingressando
no rol dos principais ideais contemporâneos. Mas essa noção é bem mais antiga:
nas décadas de 1920 e 1930, a oposição ao padrão químico, moto-mecânico e
genético da agricultura moderna já havia impulsionado o surgimento de algumas
vertentes “alternativas”, que valorizavam o potencial biológico e vegetativo
dos processos produtivos. Na Europa, surgiram as vertentes biodinâmica,
orgânica e biológica e, no Japão, a agricultura natural.
Durante décadas, essas vertentes se
mantiveram à margem da produção agrícola mundial e da comunidade científica
agronômica. Eram consideradas retrógradas e sem validade científica. Mas, no
final dos anos 1960, tornaram-se mais evidentes os danos ambientais provocados pela
agricultura moderna. A constatação de que os alimentos e o leite materno
continham resíduos de produtos químicos utilizados na agricultura soou como um
alarme para a população e para a comunidade científica. Foi nesse contexto que
a hostilidade em relação às vertentes alternativas foi aos poucos se
transformando em curiosidade. Nos anos 1990, as incertezas dos consumidores
diante do mal da “vaca louca” e dos produtos geneticamente modificados
contribuíram para a ampliação do consumo de alimentos provenientes de sistemas
produtivos “certificados” pelas vertentes alternativas, particularmente pela
agricultura orgânica. Hoje os produtos orgânicos estão espalhados por
restaurantes e supermercados dos principais centros urbanos.
Claro, o avanço dessas vertentes não é a
única forma de se atingir uma agricultura mais sustentável. Qualquer sistema de
produção agropecuária que promova a conservação dos recursos naturais –
particularmente do solo e da água – e que consiga reduzir o uso de insumos
sintéticos nocivos à saúde e ao ambiente estará mais próximo desse ideal. Outro
princípio importante é a diversificação dos cultivos. Hoje se sabe que quanto
maior o número de espécies presentes em um determinado ecossistema, maior será
a sua estabilidade e menor a necessidade de insumos externos. É fundamental, portanto,
que se promova a substituição progressiva dos sistemas agrícolas muito
simplificados, como as monoculturas, por sistemas produtivos muito mais
diversificados.
As vantagens
ecológicas dos sistemas produtivos diversificados são geralmente acompanhadas
por vantagens econômicas: além da redução da compra de insumos, os sistemas
diversificados propiciam colheitas de diferentes cultivos em épocas do ano
alternadas. Assim os ingressos de renda agrícola são distribuídos de forma mais
homogênea durante o ano. A quebra de uma safra, ou a queda de preço de uma
determinada cultura, não causa tantos problemas quanto nas propriedades
monoculturais.
Entretanto, a transição a um novo padrão
agrícola mais sustentável não depende, simplesmente, da adoção de um conjunto
de práticas menos prejudiciais ao ambiente. Cada agroecossistema apresenta características
distintas, exigindo, portanto, soluções específicas a serem definidas localmente.
Uma agricultura mais sustentável tende a exigir muito mais conhecimento
“sistêmico”, isto é, um conjunto de informações que possibilite a compreensão sobre
as interações entre os diversos componentes de um agroecossistema.
O anseio de uma agricultura sustentável
também jamais será atingido por meio de ações isoladas, deste ou daquele setor.
As soluções para os problemas ambientais que caracterizam a agropecuária
brasileira passam, necessariamente, por um amplo processo de negociação entre governo,
setor privado e organizações da sociedade civil, inclusive organização de
consumidores. A transição para uma agricultura sustentável não é, portanto, um
processo trivial que se dará de uma hora para outra. Essa transição poderá durar décadas, mas o
importante é que há claros indícios de que ela já começou.
Fonte: Almanaque Brasil Socioambiental (2008)
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