Proposta prevê 40% do ensino médio à distância e 100% para o curso de jovens e adultos (EJA) / Wikimedia Commons
Ensino
médio à distância é "tentativa de privatizar educação", diz
pesquisadora
Para Maria Raquel Caetano, doutora em
Educação pela UFRGS, resolução do governo simboliza precarização de direito
básico
Emilly Dulce
O governo de Michel Temer (MDB)
quer permitir que até 40% do ensino médio seja realizado à distância (EAD).
Para a educação de jovens e adultos (EJA), a proposta é de que todo o curso
seja fora da escola. A resolução, fruto da reforma do Ensino Médio, aprovada em
2017, foi discutida no Conselho Nacional de Educação (CNE) e atualiza as
Diretrizes Curriculares Nacionais do Ensino Médio.
Para Maria Raquel Caetano, pesquisadora e
doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), o
governo federal apresenta um discurso de inovação, eficiência e redução de
gastos, mas a ação, no entanto, é uma "tentativa de privatização do ensino
público e aprofundamento das desigualdades sociais". Segundo ela, essa é
uma estratégia para não enfrentar os grandes problemas do ensino médio, como a
evasão escolar e a carência de professores e infraestrutura básica.
"Ao mesmo tempo em que a PEC 55
congela por 20 anos o investimento público nas áreas sociais, em especial na
educação, isso é perfeito para a narrativa do governo de repassar as políticas
sociais para o setor privado", afirma.
Maria Raquel aponta um esvaziamento do
conteúdo educacional do ensino público, o que, segundo ela, dá margem para a
precarização de um direito básico. "A oferta permanece pública, mas as
instituições privadas operam por dentro das escolas, interferindo na gestão e
no currículo, que é o coração do ensino e que pauta a formação do sujeito. Portanto,
a proposta de formação cidadã é deixada de lado e entra a formação para o
mercado, precarizado também pela reforma trabalhista".
O coordenador geral da Campanha Nacional
pelo Direito à Educação, Daniel Cara, destaca que o sucateamento do ensino público
também pode se dar pela proposta de substituição de professores por tutores.
Para ele, o direito à educação no Brasil está em risco quando o governo federal
apresenta subterfúgios que precarizam uma etapa fundamental para a construção
da autonomia dos estudantes.
"A questão central é uma tentativa
de precarizar os direitos sociais e a educação tem sido o mais atacado, porque,
depois da previdência, é o direito social que mais tem custos, que mais
representa necessidade de investimento", diz.
Roberto Catelli Jr., coordenador
executivo da Ação Educativa, ressalta que a proposta de educação integral à
distância para o EJA não será inclusiva, porque o modelo não atende a
necessidade da maior parte dessas pessoas. "Tornar a educação de jovens e
adultos 100% à distância dificilmente será um benefício, porque essas pessoas
precisam de acompanhamento presencial e estímulos para estudar. Não será um
modelo à distância que irá trazê-los de volta para que o direito à educação
seja de fato efetivado".
Por isso, Maria Raquel defende uma
educação pública com qualidade social. "Por um lado, isso explica também o
esvaziamento na formação de professores, especialmente na área social e humana.
Isso é gravíssimo para a educação e para a formação de uma sociedade mais
justa, igualitária, humana e comprometida com os valores cidadãos".
Sobre a proposta, a pesquisadora diz que
falta diálogo com os personagens mais importantes: alunos e professores. Ela
conta que as entidades e instituições da categoria não foram consultadas.
"Definitivamente, nós precisamos compreender que a educação de qualidade
social se faz com investimento público, para o público e com o público. Nós
precisamos avançar na gestão democrática, que não tem sido um princípio
utilizado pelo governo ao priorizar a interlocução apenas com os
empresários".
O processo sobre a resolução de ensino à
distância deve ocorrer ainda neste semestre. Após a definição das diretrizes,
caberá a cada rede de ensino regulamentar formatos e ferramentas educacionais.
Edição: Camila Salmazio
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