Cacho de buriti (Foto: Bento Viana/ISPN)
BURITI
Existem alguns livros que são tão
poderosos que despertam na gente o desejo de sair mundo afora em busca das
pessoas e dos lugares descritos na estória. O “Grande Sertão: Veredas” é um
livro que faz isso. Você sabe o que é uma vereda? Você já escutou um buritizal?
Já leu “Grande Sertão...” do Guimarães Rosa?
Vereda é uma região úmida, à beira de
córregos e riachos com muitos buritis, árvore típica dos campos gerais, um tipo
de Cerrado. Dizem que as veredas mais bonitas estão no norte de minas, no
parque nacional “Grande Sertão: Veredas”.
As veredas ficam entre as chapadas, como
divisórias. São vales com água, oásis. Nas veredas, sempre tem buritis. E onde
tem buriti, tem água. Tanto que é difícil atravessar uma vereda: o chão é pantanoso
e se não tomar cuidado onde pisa, pode atolar.
Onde tem buritizais enormes, o povo
também fica receoso de entrar para pegar coquinho de buriti por causa da
sucuri. Só tem um jeito: eles pegam uma folha do buriti e batem com toda força
no chão. Devem bater com muita força, porque dizem que parece tiro de espingarda.
A sucuri, que não gosta do barulho, vai para a toca dela, dá um gemido que estremece
o chão. Quando a sucuri grita assim, por causa do barulho da folha de buriti, o
povo fica sabendo onde ela está.
A Mauritia flexuosa, o buriti, é um tipo
de palmeira do Cerrado, que chega a 30 metros de altura, com um tronco ereto e
solitário, sem ramificações, entre 30 e 60 cm de diâmetro. Da palha de buriti,
é possível fazer telhado de casa, uma esteira, uma capa de chuva. Da fruta se
tira o vinho.
Guimarães Rosa dizia que o buriti tinha
muitas cores. Quando a folha nasce, ela é verde, verde. Quando está “madura”, a
folha é amarelada. O fruto é lindo, às vezes marrom com vermelho, ou amarelo,
às vezes cor de vinho. “Morena da cor de buriti”, diz o Guimarães sobre uma
personagem de um de seus livros.
Não é só o Guimarães que achava o buriti
bonito. Ele mesmo, o buriti, sabe que é bonito. Guimarães Rosa dizia que ele só
vive às margens de riachos e córregos porque precisa de um espelho para se
olhar.
Rosa trabalhou de “ajudante de vaqueiro”
e, em uma das viagens, a tropa saiu da beira do rio São Francisco e foi até
perto de Cordisburgo (MG), a cidade onde Rosa nasceu e morou quando menino. Eles
viajaram com uma boiada de 600 bois durante dez dias.
Seu Zito, cozinheiro da tropa, conta que
Guimarães Rosa andava com uma cadernetinha pendurada no pescoço e anotava tudo,
perguntava o que era cada pássaro, cada planta. Seu Zito conta que um dia ele
perguntou para que servia uma árvore toda furada, um pau velho, esburacado. E
seu Zito respondeu ao Guimarães que era onde os papagaios faziam ninhos e
chocavam seus ovos. Esses papagaios do pau oco são os que mais sabem falar e
repetir porque desde pequeno ficavam ouvindo o zumbido que as folhas balançando
faziam dentro do buraco. Guimarães colocou em seus livros tudo que ele viu,
ouviu e imaginou na viagem que fez pela região de Cordisburgo, junto com os
vaqueiros.
No sertão dos campos gerais, a vista vai
longe, não esbarra em nada. O céu parece muito maior do que a terra. Dizem que
é por isso que o povo de lá é tão imaginoso.
Fonte: Almanaque Brasil Socioambiental (2008)
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