Crise no Iêmen: entenda o que acontece no país!
Escrito por Letícia Moura/Portal Politize!
Você já
ouviu falar do Iêmen? Ultimamente esse país tem virado tema de muitas
discussões e notícias, pois está passando por uma profunda crise em diversos
aspectos, principalmente no humanitário. Quer descobrir mais sobre a crise no
Iêmen? Vem que o Politize te explica!
IÊMEN: QUE PAÍS É ESSE?
O Iêmen é
um país árabe que está localizado, mais precisamente, na península arábica. Sua
capital e cidade mais populosa se chama Sana’a. Por conta de sua localização, é
um país de grande importância estratégica, pois está situado em uma importante
rota comercial de petróleo, de modo que os navios petroleiros da região
precisam passar por ele. Além disso, é vizinho dos principais produtores de
petróleo do oriente médio: Arábia Saudita, Oman e Irã.
A QUESTÃO RELIGIOSA: UM ELEMENTO DA CRISE NO IÊMEN
Antes de
entendermos o conflito político, precisamos entender a questão religiosa no
país, afinal as vertentes religiosas também estão envolvidas no conflito.
Grande parte da população na região é de etnia árabe e religião muçulmana, só
que dentro da religião muçulmana, existem duas diferentes vertentes: os Xiitas
e os Sunitas. Os Sunitas compõem a grande maioria da península arábica, sendo
da vertente Xiita apenas três países dos arredores: Iraque, Irã e o Bahren.
A PRIMAVERA ÁRABE E O CRESCIMENTO DAS TENSÕES
Agora que
entendemos as diferentes alternativas religiosas, voltamos um pouco até o ano
de 2011. Nesse ano, iniciava-se o movimento conhecido como Primavera Árabe, que
consistiu em uma série de protestos que tinham como objetivo exigir uma melhor
qualidade de vida para a população e derrubar os governos ditatoriais e
opressores que vigoravam na época.
A
Primavera Árabe conseguiu alguns de seus objetivos, surtindo efeito na Tunísia,
Egito e Líbano, derrubando seus respectivos líderes. Assim, esse movimento
chegou no Iêmen atingindo Ali Abdullah Saleh, que acabou sendo deposto pelo
movimento.
A DERRUBADA DE SALEH E O COMEÇO DO CONFLITO
Após a
saída de Ali Abdullah Saleh, e logo depois, sua morte, o controle no Iêmen fica
nas mãos do seu vice, Abd Rabbuh Mansur Al-Hadi. Contudo, o atual presidente,
Abd Rabbuh, se identificava com a vertente Sunita e esse fato acabou por causar
um conflito entre os Sunitas e os Xiitas. Desse modo, a minoria Xiita, que se
autointitula “Hutis” (Houthis), começa uma série de movimentos contra o atual
presidente.
Assim, em
Julho de 2014, os Hutis deram início a sua ofensiva visando o controle da
cidade de Sanna’a. Em 21 de Setembro os Hutis conseguem o comando de Saana’a.
Em 20 de janeiro de 2015, após novos combates, os Hutis se apoderam do Palácio
Presidencial em Sanaa e cercam a residência do presidente Abd Rabbuh Mansur
Hadi. O presidente então foge para Áde, uma cidade que fica ao Sul do Iêmen –
e, consequentemente, os Hutis conseguem o controle da sede do governo e da
rádio estatal.
Contudo,
lembremos que os Sunitas constituem maioria, assim, os Xiitas contaram com a
ajuda do Irã, que é um dos países vizinhos do Iêmen e possui população de
maioria Xiita, similar ao grupo Hutis. A medida que o Irã passou a apoiar os
Xiitas, a Árabia Saudita, também vizinha do Iêmen, passou a apoiar os Sunitas,
vertente de maior apelo popular na região.
No dia 26
de Março de 2015, a Arábia Saudita e seus aliados põem em prática uma
intervenção saudita no Iêmen, apoiada por outros países – como Emirados Árabes
Unidos, Kuwait, Bahrein, Sudão, Egito, Jordânia, Marrocos, e, até 2017, Catar
-, que passam a formar a “Coalizão Saudita” – também chamada de Operação
Renewal of Hope (ORH).
A
primeira operação da Coalizão é chamada de “Operação Decisive Storm” e seu
principal objetivo foi restabelecer Hadi como presidente e controlar o avanço
dos Houthis sobre Àde, a cidade ao Sul, a qual o presidente Abd Rabo Mansur
Hadi se abrigou, por meio de ataques e bloqueios aéreos e navais. Os ataques,
logo nas primeiras semanas, atingiram o seu objetivo de neutralizar o exército
Hutis.
No dia 21
de abril de 2015, 28 dias após o início da “Operação Decisive Storm”, a
coalizão saudita declarou que, devido ao sucesso dos ataques, a operação seria
substituída por outra, a chamada “Operação Renewal of Hope”, que está em vigor
até hoje. Os ataques aéreos continuam sendo o foco principal da coalizão, e
culminou na “Operação Golden Arrow”, uma operação liderada por forças dos
Emirados Árabes Unidos e do exército do Iêmen, que retomou o controle da cidade
portuária de Àde.
Mediante
diversos ataques dos dois lados, o conflito se intensificou ainda mais no ano
de 2015, quando os Hutis promoveram um ataque a míssel contra a capital e mais
populosa cidade da Arábia Saudita, Riad. A Arábia Saudita respondeu com um
bloqueio marítimo, terrestre e aéreo no Iêmen, que foi aprovado pelo Conselho
de Segurança das Nações Unidas.
O
bloqueio logo se estendeu aos outros portos controlados pelos Hutis e agravou o
caos humanitário vivenciado por milhões de iemenitas, restringindo inclusive os
carregamentos das Nações Unidas, para ajuda humanitária. Após intensa crítica
internacional, a Arábia Saudita levantou o bloqueio no final de 2017, aliviando
parte da pressão humanitária, não mudando, no entanto, a dependência das
decisões políticas sauditas sobre a permissão do tráfego comercial e
humanitário.
ALGUNS ACONTECIMENTOS QUE CHOCARAM O MUNDO
O
conflito se estende até hoje e está provocando a pior crise humanitária do
mundo, segundo a ONU, que estima em 14 milhões o número de mil feridos desde
2015, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). No meio de 5 anos de guerra, alguns
acontecimentos foram marcantes dentro desses anos de conflito e acabaram por
chocar o mundo e escancarar a situação iemenita.
Um deles
ocorreu no dia 7 de Julho de 2015, quando grupos Sunitas apoiados pela Arábia
Saudita atacaram um mercado na cidade de Harez, no nordeste do Iemen deixando
33 mortos e 67 feridos.
Outro episódio
marcante nesse conflito aconteceu no dia 11 de Agosto de 2018, quando a Arábia
Saudita e seus aliados atacaram um ônibus que levava crianças na cidade de
Sanaa. A tragédia ganhou tanta proporção que foi noticiada pelo jornal espanhol
‘El País’ e provocou uma reunião de emergência no Conselho de Segurança da ONU,
para a discussão da situação no Iêmen.
A CRISE HUMANITÁRIA
Segundo o
Escritório das Nações Unidas de Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA),
três quartos da população do país necessita de algum tipo de assistência e
proteção. Assim, a ONU classificou a crise no Iêmen como o maior desastre
humanitário da atualidade.
Dados do
ano de 2019, advindos da UNICEF, mostram que mais de 15 milhões de crianças
estão precisando de ajuda humanitária no Iêmen, e afirma que os quatro anos de
conflito no país já matou ou feriu ao menos 7,3 mil crianças. Também afirmam
que 360 mil sofrem de má-nutrição aguda severa e metade das crianças do Iêmen
com menos de 5 anos – 2,5 milhões – estão com o crescimento atrofiado, uma
condição irreversível. Mais de 2 milhões de crianças estão fora da escola.
Ainda de
acordo com à agência de saúde sexual e reprodutiva das Nações Unidas, o UNFPA,
“as dificuldades de acesso a alimentos no Iêmen e outras privações provocadas
pelo conflito podem levar ao pior caso de fome da história e colocar em risco a
vida de até 2 milhões de grávidas e lactantes”.
Estima-se
que 24,3 milhões de iemenitas (quase 90% da população) não têm acesso à rede
pública de eletricidade e 16 milhões de pessoas carecem de acesso a quantidades
adequadas de água segura e serviços de saneamento. Esses obstáculos acabam
gerando péssimas condições sanitárias que, aliadas à falta de recursos médicos,
também provocam a morte de milhares de pessoas
Além da
questão de sobrevivência no país, há também, segundo a ONU, cerca de 3 milhões
de pessoas fugindo de seus lares e 2 milhões delas seguem deslocadas.
A QUESTÃO DA DESIGUALDADE DE GÊNERO NO IÊMEN
Apesar do
conflito no Iêmen se apresentar catastrófico para todos, homens e mulheres no
geral, o sexo feminino merece um destaque por conta do tratamento dado às
mulheres iemenitas antes mesmo do conflito.
Um
relatório de 2013 revelado pelo Fórum Econômico Mundial (WEF) mediu a igualdade
de gênero em 136 países e chegou a conclusão de que o Iemen é o pior país no
quesito igualdade de gênero. Esse dado foi extraído antes do conflito no país,
portanto podemos imaginar que dessa época em diante, as coisas não devem ter
melhorado para as mulheres.
De acordo
com o relatório, apenas 49% das mulheres iemenitas são letradas, isto é, são alfabetizadas
ou possuem algum tipo de educação formal, comparativamente com os 82% dos
homens Iemenitas. Além disso, os dados também afirmam que não existem mulheres
no parlamento do país mostrando que a administração pública, antes da guerra no
país, é formada exclusivamente por homens.
Existem,
ainda, relatos de imigrantes que habitaram o país e contam um pouco sobre a
situação das mulheres iemenitas. Um desses relatos foi feito em 2012, ainda
antes do conflito armado que perdura até hoje, pelo escritor Espanhol Pedro
Riera, autor de uma história em quadrinhos que aborda o assunto, intitulada ‘El
coche de Intisar” (O carro de Intisar, em tradução livre). O título faz
referência a falta de apoio no país para com as mulheres que desejam dirigir.
Em uma entrevista
para o jornal ‘O Globo’ em 2012, o escritor afirma que: “No país, mulheres são
praticamente proibidas de falar com qualquer homem que não seja de sua
família”. Além de relatos sucintos e dados extraídos, é possível perceber o
tratamento desigual para com as mulheres, não só no Iêmen, como nas regiões
próximas a ele, no Oriente Médio, onde as mulheres não podem dirigir, como no
caso da Arábia Saudita, não podem trabalhar, ou estudar, escancarando assim a
situação lastimável a qual as mulheres passam em tais países
QUAL O PAPEL DOS PAÍSES E ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS EM MEIO A SITUAÇÃO
IEMENITA?
Países
como Bolívia, Holanda, Peru, Suécia e Polônia, já solicitaram reuniões com o
Conselho de Segurança da ONU, a fim de tentar mediar o conflito. Além disso, as
Organizações Internacionais, principalmente a ONU, têm como papel prestar
suporte humanitário a todos os afetados pela crise no Iêmen, por meio de envio
de recursos básicos como alimentação e roupas.
No mês de
fevereiro de 2019, o secretário geral da ONU, António Guterres, afirmou ter
conseguido doações no valor de 2 bilhões de dólares para fornecer ajuda a
milhões de civis iemenitas que enfrentam uma “esmagadora calamidade
humanitária”, após quase quatro anos de guerra brutal. Na Suíça, Guterres
elogiou a generosidade dos Estados-membros da organização para a ajuda
humanitária no Iêmen.
POSSÍVEL PONTO FINAL PARA GUERRA DO IÊMEN?
Em 30 de
outubro de 2018, os Estados Unidos (um dos aliados da Arábia Saudita) pediram
que se ponha um fim à guerra e em particular aos ataques aéreos da coalizão
liderada pela Arábia Saudita.
Em 21 de
novembro de 2018, o enviado da ONU, Martin Griffiths, começou consultas para
manter diálogos de paz, além disso, o conselho de segurança da ONU aprovou, em
16 de Janeiro de 2019, a criação de uma
missão da ONU no Iêmen, responsável por apoiar um acordo de cessar-fogo na
cidade portuária de Hodeida, um dos pontos do conflito.
Atualmente,
em torno de 20 profissionais no terreno inspecionam a suspensão das
hostilidades, mas ainda não existe nenhum plano definitivo que prometa acabar
de uma vez com este conflito, apesar de demonstrar intenção de cessar fogo, os
diálogos e acordos ainda estão em andamento.
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