Guerra das Malvinas: a disputa entre Argentina e Reino Unido
Escrito por Renan Lima /Portal Politize!
Em 2019,
a Guerra das Malvinas completou trinta e sete anos de história. Desde então a
relação entre Argentina e Reino Unido nunca mais foi a mesma. Para entender
essa história teremos que ir até a época das grandes descobertas, afinal é lá
que os primeiros embates aconteceram.
Mas
afinal de contas, porque um conjunto de ilhas ao sul do atlântico despertaria
tanto interesse? Quais seriam as motivações de grandes potências europeias como
França, Holanda, Reino Unido e Espanha? E onde fica o Brasil nesse assunto? A
comunidade internacional fez algum esforço para intermediar ou tentar frear o
conflito? Neste post você encontra as respostas!
A descoberta das ilhas
Podemos
afirmar que um dos pilares da discussão a respeito das ilhas Falklands/Malvinas
esteja justamente neste ponto. A comunidade científica ainda não sabe ao certo
quem descobriu primeiro as ilhas.
A
Argentina alega que foram os espanhóis e destes herdaram os arquipélagos logo
após sua independência entre 1810-1818. Outro fator que para os Argentinos
determina a posse das ilhas é a localização geográfica, pois os arquipélagos
estão muito mais próximos de seu território.
Já o
Reino Unido afirma que as ilhas foram descobertas através de uma expedição
financiada por um inglês, o Lord Falkland.
As ilhas
eram relatadas em diversas cartas náuticas de diferentes exploradores que
utilizavam o estreito de Magalhães em viagens intra-oceânicas a caminho do
pacífico. Portanto, sabe-se que entre os séculos XVIII e XIX o controle das
ilhas era disputado pelas grandes potências europeias.
A
Argentina afirma que quem descobriu as ilhas foram os espanhóis no ano de 1522
através da expedição de Fernando de Magalhães, tendo como prova cartas náuticas
datadas da época.
Então de
onde vem o nome Malvinas? A história nos diz que no ano de 1698 as ilhas eram
frequentadas por diversos pescadores franceses atraídos pela vasta diversidade
marinha. Tais marinheiros chamavam as ilhas de “Malovines” e com o passar do
tempo as ilhas ficaram conhecidas como Malvinas.
A coroa
espanhola perde o domínio das ilhas a partir do ano de 1766 quando uma
expedição britânica chega as ilhas e cria o Port Egmont. A Espanha consegue
retomar o poder expulsando cerca de 100 britânicos em 1770. Porém, devido a
forte ameaça vinda de Londres, a Espanha devolve o porto à família real em
1771. A partir daí iniciaram-se entre as duas potências negociações para
decidir quem teria de fato a soberania das ilhas, mas o resultado destas
conversas até hoje são controversos.
Outra
questão que causa incerteza nesse conflito remete ao ano de 1774, quando os
habitantes britânicos deixam as Malvinas. O Reino Unido diz que a retirada se
deu por motivações econômicas, já a Argentina afirma que os britânicos saíram
como forma de cumprimento do pacto firmado entre Espanha e Inglaterra em 1771.
A partir
de 1774 a Inglaterra passa a fazer incursões pontuais nas ilhas. No entanto os
argentinos afirmam que a ilha foi abandonada e, nesse caso, no campo do direito
internacional, as ilhas estavam sob situação de Terra Nulis, ou seja, não
pertencente a nenhum estado e passível de ocupação por qualquer país. Então,
após o processo de formação do estado argentino entre 1810 e 1816, o país
consegue deter o controle formal das Malvinas, sob alegação de “direito de
herança” dos territórios espanhóis até o ano de 1833.
Em 1833,
a fragata inglesa Clio, comandada pelo capitão Onslow, Chega a uma das ilhas do
Arquipélago expulsando todos os aldeões do local e fundando uma colônia inglesa
que serviria de entreposto comercial e como ponto de abastecimento para os
navios que passavam pelo estreito de Magalhães. Desde então, a coroa britânica
passou a manter a soberania das ilhas Falklands.
A partir
deste episódio, a Argentina começa então um árduo processo diplomático para
reaver a soberania das ilhas, tanto bilateralmente através de tentativas de
negociação com a coroa, até tentativas multilaterais onde levou o problema para
ser debatido em organizações internacionais. Porém nenhuma dessas tentativas
lograram êxito.
Contexto histórico internacional
Devemos
lembrar que assim como no Brasil, a Argentina também sofreu um processo ditatorial
(1976-1983) onde os militares tiraram do poder o governo de Isabel Perón.
Assim, sob um regime autocrático e autoritário, a ditadura argentina tinha como
princípios a reorganização dos setores econômico, político e social.
No setor
econômico, os militares visavam o fim da dependência energética, que na época
era importada do Brasil. Também era preocupação do regime expandir a fabricação
de derivados do petróleo e concluir construções de projetos hidrelétricos. No
campo político, o foco era assegurar as fronteiras da nação especialmente com o
Chile e assegurar o território das Malvinas, fato que para os militares
serviria tanto como uma questão de soberania, como também uma questão social.
Para
conseguir manter o regime, os militares usaram de força excessiva para conter
os manifestantes contrários, além de controlar os espaços públicos impedindo
que grupos pudessem expressar suas opiniões de mundo. O congresso foi
dissolvido e a junta militar formada pelo exército, marinha e aeronáutica
tomavam todas as decisões em conjunto nomeando até o presidente. Se houvesse
alguma pauta que uma das três forças não estivesse de acordo a pauta seria
engavetada. Era o chamado “veto compartilhado”.
Uma das
Estratégias dos militares era o alinhamento com os Estados Unidos, primeiro
porque queriam ser considerados como uma potência média emergente no continente
e segundo porque queriam tirar do Brasil o papel de protagonismo no continente.
Os militares não estavam satisfeitos com a posição que a Argentina desempenhava
no cenário internacional, tampouco com seus limites territoriais, e sempre
demonstravam disposição para recorrer ao uso da força caso fosse preciso.
A década
de 70 e o começo da década de 80 foi marcada por diversos conflitos estatais,
podemos destacar índia x Paquistão, Irã x Iraque, o que demonstra claramente
uma predisposição dos estados para resolverem seus conflitos territoriais
através da força. Atrelado a isso, na década de 80 tivemos a crise do petróleo
e a emergência de novas potências econômicas como Alemanha e Japão, aumentando
o protecionismo comercial europeu e dificultando o mercado para países como
Brasil e Argentina. A chamada “crise dos países Latino-Americanos” teve também
como principal fator a elevação da taxa de juros americana de 8 para 21,5%,
provocando uma recessão global.
Por fim,
com o advento de novas potências econômicas, o Reino Unido começa a enfrentar
diversos problemas político-econômico no então governo da primeira ministra
Margaret Thatcher, chegando até a anunciar a redução de seu aparato militar em
busca de conter gastos. Tais contextos, aliados a necessidade argentina de
criar na sociedade um sentimento de patriotismo e assim ganhar sobrevida
governamental, fizeram com que os militares argentinos utilizassem a força nas
Malvinas no dia 04 de abril de 1982.
O posicionamento brasileiro
O Brasil
antes e durante o conflito adotou uma posição de apoio a Argentina, porém um
apoio modesto, tendo em vista que o Reino Unido era um importante parceiro
comercial brasileiro e o governo não queria ver essa relação desgastada. No
âmbito das Organizações Internacionais a posição do Brasil sempre foi favorável
ao pleito argentino. Devido a proximidade territorial, a Inglaterra chega a
solicitar ao governo brasileiro a permissão para atracar e reabastecer navios,
pedido prontamente negado.
Com o fim
das relações diplomáticas entre Argentina e Inglaterra o Brasil passou a
exercer em Londres o papel de representante comercial argentino através de sua
embaixada. Portanto, podemos afirmar que a posição brasileira frente ao
conflito foi a de apoio moderado a Argentina, solicitando sempre em organismos
internacionais que a situação seja resolvida diplomaticamente.
Conflito e Consequências
Em
fevereiro de 1982 membros do governo da Argentina e do Reino Unido se reúnem
nos EUA em mais uma tentativa de resolver o impasse a respeito das ilhas
Falkland/Malvinas, porém sem sucesso.
Enquanto
isso, em Março de 1982 uma série de acontecimentos nas ilhas provocaram ainda
mais os ânimos das duas nações, o primeiro foi a depredação de uma estatal
aérea argentina por parte da população britânica residente na ilha descontentes
com o hasteamento da bandeira argentina. Já o segundo acontecimento, foi a
chegada nas ilhas de um navio de guerra argentino, novamente a bandeira
Argentina foi hasteada na ilha causando descontentamento dos habitantes
britânicos.
A partir
da chegada do navio de guerra argentino nas ilhas, começa a preparação
britânica para o confronto, e em 31 de março de 1982 a Inglaterra envia as
ilhas um submarino atômico e uma nau de guerra. Em contrapartida, a Argentina
mobiliza toda a sua marinha em estado de alerta. Assim, no dia 02 de Abril de
1982, registra-se o desembarque de cinco mil soldados argentinos nas ilhas
Falkland/Malvinas encontrando apenas 80 fuzileiros britânicos.
A ação
argentina põe em choque toda a comunidade internacional pois as normas
praticadas violaram tratados do direito internacional. No mesmo dia da invasão,
o conselho de segurança das Nações Unidas ordenou a retirada das tropas
argentinas do arquipélago. A Inglaterra em poucos dias montou sua expedição com
aproximadamente vinte e oito mil combatentes com o objetivo de retomar as ilhas
e o prestígio internacional, afinal o país detinha a fama de ter o maior
poderio marítimo do mundo.
No dia 14
de Junho de 1982, o inevitável acontece e as tropas argentinas batem em
retirada das ilhas. Ao todo, foram registrados 750 mortos no lado argentino e
256 no lado Britânico.
O Papel das Organizações Internacionais no conflito
O
primeiro registro que se tem a respeito do conflito das Falklands/Malvinas em
âmbito internacional encontra-se no ano de 1960, quando a Argentina leva o caso
para o Comitê Especial Sobre a Situação Relativa à Implementação da Declaração
sobre a Outorga de Independência aos Países e Povos Coloniais nas Nações Unidas,
tal organismo apenas recomendou que ambas as partes chegassem a um acordo,
frustrando o então governo Argentino.
Em 1975 a
Argentina consegue o seu primeiro apoio internacional, após levar o caso para a
V Conferência Ministerial do Movimento dos Países Não Alinhados, realizada em
Lima, os países participantes declaram apoio a Argentina e solicitam que
Londres continuem com as negociações, porém agora no âmbito das Nações Unidas.
Outra
Organização Internacional que declarou apoio a causa argentina foi a
Organização dos Estados Americanos (OEA), no ano de 1976 através de seu Comitê
Jurídico Interamericano posicionando-se favoravelmente a Argentina. Porém,
apesar de todas as orientações, nenhuma delas foi determinante entre o período
de 1960-1982 para que o conflito não adentrasse para o uso da força.
A
Assembleia Geral da ONU, no entanto, não possui poder para impor nenhuma ação,
apenas constranger politicamente determinada nação. Já no Conselho de
Segurança, onde ações efetivas podem ser tomadas, a Inglaterra é membro
permanente detentor de poder de veto, todas as ações movidas para o conselho
foram vetadas tanto pela Inglaterra como também pelos Estados Unidos da
América.
Qual a situação das Malvinas hoje?
Atualmente,
estima-se que 3.398 Kelpers, denominação dos ilhéus, habitam as ilhas Falklands
que ainda é de domínio britânico. Os habitantes afirmam que desejam continuar
morando nas ilhas pois tem saúde, educação e segurança pública de qualidade. A
renda per capita dos Kelpers é a quarta maior do mundo, US$ 96.962 por ano.
Tal
desejo foi oficializado no último plebiscito realizado em 2013 pelo governo das
Malvinas em resposta a reivindicação territorial da Argentina, nele cerca de
1.672 eleitores das ilhas foram as urnas e o resultado foi favorável a
Inglaterra, 99,8% dos que votaram disseram ‘sim’ ao Reino Unido. Para esse
plebiscito, dez observadores de sete países supervisionaram o processo para
garantir uma votação justa e transparente.
No lado
argentino, as ilhas sempre foram tratadas como um território pertencente a
Argentina e tocar nesse assunto para alguns é mexer com o patriotismo nacional.
Basicamente, todos os governos que chegam ao poder no país afirmam que tentarão
reconquistar as ilhas de forma diplomática, a diferença está apenas no nível de
engajamento para o assunto entre um governo e outro. Porém, a Inglaterra sempre
foi enfática sobre o assunto, negando todo e qualquer tipo de negociação, a
menos que essa seja a vontade de seus cidadãos na ilha.
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