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Prosul: entenda o novo bloco sul-americano



Prosul: entenda o novo bloco sul-americano
Escrito por Danniel Figueiredo/Portal Politize!
Um novo grupo de países se organiza na América do Sul! E, provavelmente, essa não é a primeira vez que você lê uma frase assim. Nas últimas três décadas, ao menos um grupo novo surgiu na região, a exemplo do Mercosul, em 1991 e da Unasul, em 2008. A bola, dessa vez, é o Prosul.
Nesse texto, o Politize! te explica tudo o que você precisa saber sobre o Prosul e seus antecessores!
Afinal, o que é o Prosul?
O Prosul (Foro para o Progresso da América do Sul) é um fórum regional de diálogo. A ideia é que ele se implemente e se organize gradualmente.
Sua iniciativa partiu dos presidentes do Chile (Sebastián Piñera) e da Colômbia (Iván Duque). Já sua formação se deu no dia 22 de março de 2019, com a assinatura da “Declaração Presidencial sobre a Renovação e o Fortalecimento da Integração na América do Sul”. A declaração também leva o nome Declaração de Santiago, por conta de sua assinatura no Palacio de La Moneda, em Santiago (Chile).
O Prosul surge em um momento de enfraquecimento da Unasul, organismo que também tinha como propósito o diálogo e cooperação sul-americana. Diferente da Unasul, que surgiu em um momento em que os países tinham líderes predominantemente de esquerda, o Prosul apresenta o cenário oposto, surgindo em um momento de ascensão da direita na América Latina.
E quem faz parte do Prosul?
Oficialmente, assinaram a Declaração de Santiago, os representantes dos seguintes países: Argentina (Mauricio Macri), Brasil (Jair Bolsonaro), Chile (Sebastián Piñera), Colômbia (Iván Duque), Equador (Lenín Moreno), Guiana (embaixador George Talbot), Paraguai (Mario Abdo Benítez) e Peru (Martín Vizcarra).
Na reunião de Santiago também estiveram presentes representantes da Bolívia (vice-chanceler Carmen Almendra), do Uruguai (vice-chanceler Ariel Bergamino) e do Suriname (embaixador em Cuba Edgar Armaketo) que não assinaram a declaração, mas se colocaram dispostos ao diálogo.
A Venezuela, por sua vez, não foi convidada para o evento sob a justificativa de não ser uma democracia. O país vive a maior crise de sua história.
E qual a proposta do Prosul?
Nas palavras de seus dois idealizadores, a ideia do Prosul é:
Sebastián Piñera: “Um fórum sem ideologias, sem burocracias, franco e direto com democracia e [preservação dos] direitos humanos”
Iván Duque: “Prosul é uma aliança para a democracia, é um grande esforço para retomar a integração da América do Sul, já que não temos uma reunião de todos os chefes dos estados sul-americanos há cinco anos.”
A Declaração de Santiago, em si, traz como propósitos:
1. Cooperação e coordenação: “Construir e consolidar espaço regional de coordenação e cooperação, sem exclusões, para avançar em direção a uma integração mais efetiva que permita contribuir para o crescimento, o progresso e o desenvolvimento dos países da América do Sul”.
2. Diálogo: “Criar um espaço de diálogo e colaboração sul-americano”.
3. Implementação gradual e flexibilidade na estrutura: “Que este espaço deverá ser implementado gradualmente, ter estrutura flexível, leve, que não seja custosa, com regras de funcionamento claras e com mecanismo ágil de tomada de decisões”
4. Integração infraestrutural: “Que este espaço abordará de maneira flexível e com caráter prioritário temas de integração em matéria de infraestrutura, energia, saúde, defesa, segurança e combate ao crime, prevenção de e resposta a desastres naturais”.
5. Requisitos de participação: “Que os requisitos essenciais para participar deste espaço serão a plena vigência da democracia e das respectivas ordens constitucionais, o respeito ao princípio de separação dos poderes do estado, e a promoção, proteção, respeito e garantia dos direitos humanos e das liberdades fundamentais, assim como a soberania e a integridade territorial dos estados, em respeito ao direito internacional”.
Além disso, a declaração ainda estabelece o prazo de presidência de um ano para o Prosul, com primeiro mandato do Chile e o segundo do Paraguai.
Para que possamos entender bem o Prosul, contudo, é preciso entender a organização que ele se propõe a substituir.
O que é a Unasul?
A Unasul (União das Nações Sul-Americanas) é uma organização que teve seu início em 2008, com o estabelecimento, em Brasília, de seu Tratado Constitutivo. Ela entrou em vigor em 2011, quando atingiu a nona ratificação entre seus assinantes. Todos os 12 países sul-americanos assinaram o tratado.
Seu grande propósito era o de promover e consolidar a integração em múltiplas áreas no subcontinente (América do Sul), sucedendo a Comunidade Sul-Americana de Nações (Casa), criada em 2004, por iniciativa do Brasil. No preâmbulo do tratado constitutivo isso fica claro com a:
“Determinação de construir uma identidade e cidadania sul-americanas e desenvolver um espaço regional integrado no âmbito político, econômico, social, cultural, ambiental, energético e de infraestrutura.
Essa ideia de identidade e cidadania comum sul-americana parte de um projeto de autonomia regional e combate a assimetrias. Ou seja, visava gerar decisões conjuntas que atendessem aos interesses da América do Sul, sem a influência dos interesses dos Estados Unidos. Seus principais idealizadores foram os então presidentes de Brasil e Venezuela, Luís Inácio Lula da Silva e Hugo Chávez.
Além disso, a Unasul apresenta em seus objetivos ideias de eliminar a desigualdade socioeconômica, alcançar inclusão social e a participação cidadã, fortalecer democracia, soberania e independência dos Estados, erradicação do analfabetismo, políticas comuns de pesquisa e inovação, entre muitos outros.
Como é constituída a Unasul?
A Unasul é uma organização, dotada de personalidade jurídica internacional. Isso permitiu a criação de 4 órgãos internos:
Conselho de Chefas e Chefes de Estado e Governo: órgão máximo, com atribuições como estabelecer diretrizes políticas e convocar reuniões Ministeriais;
Conselho de Ministras e Ministros das Relações Exteriores: órgão que tem como objetivo auxiliar o Conselho de Chefes, coordenar posicionamentos, desenvolver o diálogo político, entre outros;
O Conselho de Delegados e Delegadas: formado por uma ou um representante acreditado(a) por cada Estado Membro para implementar decisões, organizar reuniões Ministeriais, coordenar Grupos de Trabalho, entre outras atividades;
A Secretaria Geral: “órgão que, sob a condução do Secretário Geral, executa os mandatos que lhe conferem os órgãos da UNASUL e exerce sua representação por delegação expressa dos mesmos”.
Já sua Presidência é de prazo anual, e deve ser exercida por cada um dos Estados membros, em ordem alfabética.
Acompanhado de tudo isso, vinha o projeto de um Conselho de Defesa Sul-Americano (CDS), aprovado por seus membros, no qual os países membros analisariam questões políticas e estratégicas sob uma ótima comum sul-americana. Ou seja, o projeto buscava criar uma comunidade de segurança e relações pacíficas na região, para se tornar algo próximo do que é a União Europeia.
E o que aconteceu com a Unasul?
A organização veio perdendo força ao longo dos anos. Além de dificuldades orçamentárias, alguns fatores que ajudam a explicar isso são:
A perda de sua base: os principais projetos de governo que criaram a Unasul, como os de Lula, Chávez, Christina Kirchner, Rafael Corrêa, por exemplo, perderam espaço em seus respectivos países. A liderança, que veio do Brasil durante o período Lula, foi se perdendo em meio as crises internas do governo Dilma e a Unasul acabou sendo deixada de lado.
A desconfiança: Segundo Günther Maihold, do instituto berlinense de estudos de política externa SWP, ouvido pela DW, o discurso de integração sempre foi mais uma ideia de coordenação política do que uma prática real, que viesse a se sobrepor às soberanias. Para ele, “à segurança, a desconfiança e o instinto prevalecem em muitos países sul-americanos para preservar a soberania nacional em qualquer circunstância”.
A ausência de Secretario-Geral: Desde 2017, quando terminou o mandato de Ernesto Samper, a Unasul está sem Secretário-Geral. Isso porque, em 2016, Venezuela, Equador e Bolívia bloquearam a indicação do embaixador argentino José Octávio Bordón, alegando que o cargo só poderia ser ocupado por um ex-presidente ou ex-chanceler. Desde então, não houve consenso quanto a isso.
Esvaziamento: Em 2018, em meio a divergências internas, Brasil, Argentina, Chile, Colômbia, Peru e Paraguai assinaram uma carta de afastamento da Unasul. Ainda em 2018, a Colômbia, pós posse de Iván Duque, anunciou sua “decisão política” de se retirar em definitivo da Unasul. Mais recentemente, o Equador também se retirou da entidade e pediu a devolução da então sede, em Quito.
E quais as diferenças entre os dois blocos?
Na prática, as diferenças podem ser percebidas em três pontos principais:
Estrutura: Enquanto a Unasul apresenta uma estrutura mais bem consolidada, com uma série de órgãos internos e uma sede, que até a saída do Equador, era em Quito, o Prosul não tem essa proposta. A ideia é que funcione mais como um fórum de diálogo, mais flexível, que possa ser organizado de acordo com a vontade dos participantes.
Países participantes: Enquanto participaram da Unasul os 12 países sul-americanos, no Prosul 4 deles ficaram de fora até o momento: Uruguai, Bolívia, Suriname e Venezuela.
Perfil de líderes: Enquanto as lideranças que fundaram a Unasul tinham um perfil mais voltado à esquerda (o que não indica necessariamente que a Unasul seja uma organização de esquerda), as do Prosul são mais voltadas à direita (da mesma forma, não necessariamente o Prosul é um fórum de direita).
Mas o Prosul e a Unasul estão longe de serem os dois únicos blocos de participação de países sul-americanos nas últimas décadas. Vejamos alguns outros!
Outros blocos sul-americanos
OEA: A Organização dos Estados Americanos não é, necessariamente, um bloco sul-americano, mas engloba os países da América do Sul. Com sede em Washington, nos Estados Unidos, é um fórum político que engloba todos os países independentes das Américas (apesar de a Venezuela ter se afastado em 2017). A OEA foi fundada em 1948, com a Carta da OEA.
ALALC: A Associação Latino Americana de Livre Comércio foi fundada em 1960, influenciada pela Comunidade Europeia (antecessora da União Europeia) e pela CEPAL. A proposta era a de um mercado comum, em que os países se complementassem em seus processos de industrialização.
Contudo, ela teve pouco poder coordenativo. Em 1980, ela passou a se chamar ALADI (Associação Latino Americana de Integração). Hoje é formada por: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Cuba, Equador, México, Panamá, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela
Comunidade Andina: Com origens no Pacto Andino (Acordo de Cartagena), de 1969, a Comunidade Andina hoje é formada por Bolívia, Colômbia, Equador e Peru. Seu objetivo é a aproximação entre os países com identidade andina.
Sela: O Sistema Econômico Latino Americano e do Caribe foi criado em 1975 para fortalecer a cooperação econômica durante as negociações do GATT, antecessor da OMC. Ele engloba praticamente todos os países da América Latina.
Grupo da Contadora: Foi criado em 1983, por México, Panamá, Colômbia e Venezuela como um fórum de concerto político para mediar crises na América Central sem a influência dos Estados Unidos.
Grupo do Rio: O Grupo do Rio (Mecanismo Permanente de Consulta e Concertação Política da América Latina e do Caribe) tem sua origem da junção do Grupo da Contadora com o Grupo de Apoio a Contadora (Brasil, Peru, Argentina e Uruguai), em 1986.
CELAC: a Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos é um fórum político, e não econômico, que reúne 33 países das Américas, com exceção de Estados Unidos e Canadá. Foi fundada em 2010, com inspiração no Grupo do Rio.
ALCA: A Área de Livre Comércio das Américas foi uma proposta que partiu dos Estados Unidos de Bill Clinton, em 1994, e passou por uma série de debates ao longo dos anos seguintes, até que seu projeto foi deixado de lado, no início dos anos 2000, por conta de divergências de interesses entre os Estados Unidos e países emergentes.
ALBA: A Alternativa Bolivariana para as Américas surge em 2004, como uma resposta ao projeto da ALCA. Sua origem está em tratados assinados entre Cuba e Venezuela e sua proposta é a de promover uma integração social, política e econômica entre seus países membros (Antígua e Barbuda, Bolívia, Cuba, Dominica, Nicarágua, São Vicente e Granadinas e Venezuela).
Mercosul: o Mercado Comum do Sul tem sua origem em 1991, e, como o próprio nome diz, um objetivo econômico de gerar um mercado comum na América do Sul, aos moldes do que se fazia na Europa. A ideia era a de que o bloco pudesse representar o subcontinente em negociações internacionais e se integrar cada vez mais. Seus membros centrais são Brasil, Uruguai, Argentina e Paraguai. A Venezuela se juntou a esses em 2012, mas foi suspensa em 2016.
IIRSA: A Integração da Infraestrutura Regional Sul Americana é uma iniciativa, que como o próprio nome diz, visa coordenar grandes obras de infraestrutura na América do Sul. Surgiu em 2000, formada pelos 12 países do subcontinente.
Aliança do Pacífico: Surge em 2012, fundada por Chile, Colômbia, México e Peru, com vista à integração dos países da costa do Oceano Pacífico. Possivelmente o grupo poderá contar com Costa Rica, Panamá, Austrália, Canadá, Nova Zelândia e Singapura como associados, além de uma série de observadores.
Grupo de Lima: é um grupo formado por 14 países (Argentina, Brasil, Canadá, Chile, Colômbia, Costa Rica, Guiana, Guatemala, Honduras, México, Panamá, Paraguai, Peru e Santa Lúcia) que tem sua razão de ser em discutir caminhos para a crise da Venezuela.
E em meio a tantas iniciativas nos últimos anos, o que está sendo dito sobre o Prosul?
Como trouxemos ao longo do texto, seus principais incentivadores enxergam na iniciativa uma nova oportunidade de diálogo e retomada da cooperação na América do Sul, estremecida com a crise na Venezuela.
Na visão do Chanceler chileno, o bloco é uma demonstração do fortalecimento da liderança do Chile na América do Sul. Já para o ex-presidente Colombiano, Juan Manuel Santos, o Prosul é um projeto ideológico, “o mesmo que a Unasul do outro lado” e está fadado ao fracasso.
Em reportagem da revista The Economist, o Prosul é visto como mais um bloco que representa as fraturas na união entre os países sul-americanos. Se for enxergado como um bloco de direita, é provável que tenha o mesmo destino da Unasul quando novos governos à esquerda chegarem ao poder no continente. Na reportagem, a sugestão era a de que, ao invés de criar um bloco novo, os países se esforçassem para remodelar e reestruturar os blocos já existentes.
Muito se pensa também em qual deve ser o papel do Brasil nesse sentido. Um dos líderes da Unasul, o país perde espaço em liderança com a decadência da organização. Se o país assumirá um papel de destaque no Prosul, só o tempo dirá. Hoje, esse papel é do Chile. Para o presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, em declaração, o Brasil adentra ao Prosul porque:
A Unasul é praticamente extinta no dia de hoje, falta prática e o Prosul está aparecendo. Nós não podemos admitir que as políticas dos países aqui sejam movidas por ideologias é só isso
Veremos, nos próximos anos, se o Prosul será um projeto de grande sucesso ou mais um projeto a entrar no “limbo” no continente. Entender o presente, à luz do passado, é uma boa base para se olhar para o futuro.

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