Brumadinho: Minas Gerais
rejeita valor de reparação proposto pela Vale
Rompimento de barragem
completa dois anos na segunda
Mais uma audiência para negociação do
principal acordo de reparação da tragédia de Brumadinho (MG) terminou sem
consenso. O governo mineiro rejeitou hoje (21) os valores propostos pela
mineradora Vale, responsável pelo rompimento da barragem que causou impactos
socioambientais em diversos municípios do estado. Após o episódio, que
completará dois anos na próxima segunda-feira (25), 259 corpos foram resgatados
e 11 pessoas permanecem desaparecidas.
De acordo com o secretário-geral do
governo mineiro, Mateus Simões, não haverá mais audiências. A Vale terá até dia
29 de janeiro para apresentar uma proposta que atenda às expectativas do
executivo estadual. Do contrário, o processo que julga a tragédia retomará sua
tramitação normal na primeira instância do Tribunal de Justiça de Minas Gerais
(TJMG) e caberá ao juiz Elton Pupo Nogueira sentenciar os termos da reparação.
"Não vamos nos lançar num leilão
para definir o valor desse acordo. Os projetos que foram apresentados somam um
valor que é o mínimo necessário para garantir a recomposição dos danos
gravíssimos que foram causados. Discutir os valores como se estivéssemos dando
lances não será aceito pelo estado", disse Mateus Simões.
O secretário-geral também disse se
incomodar com o tom usando pelos representantes da Vale. "Soa como se ela
estivesse dando um presente a Minas Gerais", disse. "Que ela entenda
que esse acordo será celebrado como o maior acordo da história do Brasil ou a
condenação virá como a maior condenação da história do Brasil. Cabe à empresa
decidir se ela quer passar para a história como aquela que, reconhecendo o que
fez, resolveu reparar os danos ou que, não reconhecendo o que fez, irá esperar
ser condenada".
Além de representantes da empresa e do
governo de Minas Gerais, as negociações envolvem o Ministério Público de Minas
Gerais (MPMG), o Ministério Público Federal (MPF), a Defensoria Pública da
União e a Defensoria Pública do estado. Ontem (20), o procurador-geral da
República, Augusto Aras, também esteve em Belo Horizonte para discutir o tema e
se reuniu o governador Romeu Zema e com representantes das instituições de
Justiça envolvidas nas tratativas.
O MPMG divulgou nota dizendo que as
negociações estão encerradas. "As instituições não podem abrir mão de que
a Vale faça o ressarcimento completo de todo o dano resultante da tragédia, ou
seja, reparação integral do meio ambiente, ressarcimento ao Estado e
atendimento aos atingidos", diz o texto.
Vale
Por sua vez, a Vale afirmou ter confiança no Poder Judiciário. Em nota, a empresa disse que já desembolsou R$ 10 bilhões no processo de reparação e que vem prestando assistência aos atingidos por meio de ações diretas nas regiões e de acordos individuais.
"A Vale reconhece, desde o dia do
rompimento, sua responsabilidade pela reparação integral dos danos causados.
Embora as partes não tenham chegado a consenso, a divergência concentra-se em
aspectos relacionados a valores a serem pagos e à sua destinação. A Vale
continuará a cumprir integralmente sua obrigação de reparar e indenizar as
pessoas, bem como de promover a reparação do meio ambiente, independentemente
de haver condenação ou acordo", acrescenta o texto.
As negociações vinham se arrastando em
diversas audiências dentro de uma ação civil pública onde o MPMG pedia
inicialmente uma indenização de R$ 54 bilhões. Desse montante, R$ 28 bilhões
seria para cobrir danos morais sociais e coletivos. Os R$ 26 bilhões restantes
se referiam às perdas econômicas conforme apontou um estudo da Fundação João
Pinheiro, instituição de pesquisa e ensino vinculada ao estado de Minas Gerais.
O valor da última contraproposta da
mineradora não foi revelado. No início das tratativas, ela ofereceu R$ 21
bilhões. Além dos valores, outro ponto-chave das negociações era a governança
dos projetos de reparação. Um consenso em torno dessa questão foi alcançado em
audiência realizada no fim do ano passado.
Atingidos
Os atingidos vinham criticando o
processo de negociação do acordo. Eles realizaram diversas manifestações na
porta do TJMG nos dias agendados para as audiências. A principal crítica dizia
respeito à falta de transparência. Como as negociações vinham se dando sob o
princípio da confidencialidade, apenas os participantes das tratativas tiveram
conhecimento dos detalhes. Não foram tornados públicos os projetos que estavam
em discussão.
As três organizações que foram
escolhidas pelos próprios atingidos da tragédia de Brumadinho para
assessorá-los - a Associação Estadual de Defesa Ambiental e Social (Aedas), o
Núcleo de Assessoria às Comunidades Atingidas por Barragens (Nacab) e o
Instituto Guaicuy - chegaram a publicar um documento pleiteando que todos os
termos do acordo sejam tornados públicos. Também cobravam a criação de espaços
abertos para discuti-lo.
No início do mês, a Aedas também
apresentou uma lista com 220 medidas prioritárias para a reparação dos danos. O
levantamento foi feito após um processo que teve a participação de 4.067
atingidos. A matriz emergencial de medidas reparatórias, como foi chamado o
documento, divide as demandas em oito categorias: comunicação e acesso à
informação; água; moradia; infraestrutura e serviços públicos; trabalho;
mulheres, crianças e adolescentes; meio ambiente; e danos morais e materiais.
A Associação dos Familiares de Vítimas e
Atingidos do Rompimento da Barragem da Mina Córrego do Feijão (Avabrum),
entidade criada pelos familiares dos mortos na tragédia, avalia que o acordo
vinha sendo negociado num momento em que se nota uma redução dos esforços para
encontrar os desparecidos. "Tem 11 pessoas para serem encontradas. Essa
deveria ser a prioridade. As famílias estão se sentindo desamparadas. Enquanto
um acordo bilionário é negociado, os investimentos nas buscas são reduzidos.
Famílias estão desesperadas para ter o encontro dos seus", disse Josiane
Melo, presidente da entidade.
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