Como era a
internet no Brasil antes da comercialização
Demi
Getsckho fez a primeira conexão TCP/IP no Brasil
Publicado em
04/05/2021 - 06:10 Por Leyberson Pedrosa e Luiz Cláudio Ferreira - Repórteres
da Agência Brasil - Brasília
Na linha do
tempo da evolução das tecnologias de comunicação do Brasil, a internet traz
consigo abreviações, siglas e protocolos. Porém, muito além dos termos
técnicos, a chegada da internet ao Brasil se deve, em grande parte, a
cientistas debruçados sobre um único interesse: conectar os pesquisadores
brasileiros ao mundo.
“Repnet,
BitNet, Internet. Não importa o nome, o importante era conectar.” Essa é a
visão do doutor em engenharia Demi Getschko, pioneiro na implantação da
internet no Brasil, e diretor-presidente do Núcleo de Informação e Coordenação
do Ponto BR (NIC.BR). Em 1991, ele foi um dos responsáveis por adotar o TCP/IP
no Brasil, protocolo usado pela internet que padroniza as comunicações de rede.
Mesmo
apaixonado pelos desafios matemáticos das telecomunicações, Getschko teve sua trajetória
totalmente direcionada ao digital quando foi trabalhar no centro de
processamento de dados da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo
(Fapesp), em 1985. O acadêmico gosta de deixar claro que a internet surgiu
apoiada sobre as telecomunicações, mas como uma aplicação própria e
descentralizada.
Para entender
melhor essa história, é importante retornar a meados de 1987. O Brasil estava
sob o governo Sarney; o Plano Bresser congelava os preços dos alimentos e a
Embratel monopolizava as redes de telecomunicações no país. Nesse período,
pesquisadores brasileiros que viajavam para a América do Norte e Europa
voltavam ao Brasil após terem contato com novas formas de comunicação por meio
de correio eletrônico e de fóruns de discussão em redes de computadores. Para
não deixá-los sem acesso a esse novo mundo, organizações como a Fapesp, em São
Paulo, e o Laboratório Nacional de Computação Científica (LNCC), no Rio de
Janeiro, buscavam meios de, literalmente, conectarem bits e bytes ao exterior.
Em São Paulo,
a solução foi centralizar o fluxo de dados a partir da conexão entre um
computador da Fapesp e o laboratório de física de partículas em Chicago nos
Estados Unidos, o Fermi National Accelerator Laboratory (Fermilab). O centro de
pesquisa norte-americano estava conectado a uma rede de computadores
internacional, a BitNet (Because It's Time to NETwork / Porque é hora da rede)
. “A gente contratou uma linha internacional da Embratel entre nós e o Fermilab
e as outras universidades se conectaram a nós”. Getschko explica que a linha
contratada era de apenas 4.800 bits por segundo. Ou seja, 8 kbps, menos de 1%
de uma conexão atual de 10 mbps.
Essa solução fez com que universidades brasileiras de São Paulo, do Paraná, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro se conectassem entre si pela Bitnet. O problema é que as redes LNCC e Fapesp não se comunicavam diretamente. Assim, um dado da Universidade Federal de Santa Maria, que estava conectada ao LNCC, por exemplo, precisava percorrer, ao menos, dezenas de milhares de quilômetros de cabos de telefonia nos Estados Unidos antes de chegar até a USP, ligada a rede da Fapesp, que fica a menos de 1,5 mil quilômetros de distância.
Esse gargalo
foi resolvido em 1989 quando LNCC e Fapesp foram conectadas entre si. Nesse ano
também surgiu a Rede Nacional de Pesquisa (RNP), o que ampliou a rede acadêmica
de conexões brasileiras com a rede mundial
de computadores. Era o auge da Bitnet no Brasil.
Mas esse
modelo de rede durou pouco. Em 1990, o laboratório Fermilab, que abriu as
portas do mundo para a Fapesp, disse que migraria da Bitnet rumo à internet
(TCP/IP) por ter uma maior capacidade operacional. Novamente, a fundação pegou
carona nas mudanças tecnológicas e, em dezembro de 1991, sob os olhos atentos
Getschko, já haviam pacotes de dados chegando e saindo do Brasil no idioma
atual da internet.
Domínios
.br
Em 1989, a
Fapesp recebeu os direitos, mesmo de forma informal, de explorar o uso do
domínio .br. Assim, como lembra Getschko, as máquinas brasileiras passaram a
ter nome e sobrenome. Se hoje é comum pagar um domínio .com.br ou .net.br, até
1998 esse registro era gratuito desde que se respeitasse uma série de regras
hierárquicas. O .gov.br, por exemplo era somente para governos. O .br, como já
era usado desde o início pelas universidades brasileiras, ficou como estava
(usp.br, unesp.br, ufrj.br, fapesp.br, etc.).
Em 1995,
criou-se o Comitê Gestor da Internet (CGI.br) para dar diretrizes e políticas
da internet no país, passando a controlar formalmente a gestão dos domínios
.br. Também foi nesse ano que os provedores passaram a permitir conexões
discadas (dial-up) de TCP/IP aos usuários. Meses antes, em dezembro de 1994, a
Embratel já havia experimentado o Serviço de Internet Comercial com 5 mil
usuários inscritos. Contudo, Demi lembra que ele e outros pioneiros perceberam
que o modelo adotado limitaria a escalabilidade da internet no Brasil.
“No começo de
1995, o Ministério das Comunicações soltou uma portaria dizendo que a Embratel
não poderia fazer conexões TCP/IP diretamente aos usuários. Ele tinha que dar
para as teles (Telecom). E as teles tinham que repassar aos provedores e os
provedores, aos usuários... Em pouco tempo, tivemos um crescimento muito
importante em redes porque foi montada uma estrutura que era um círculo
virtuoso que era escalável."
Confira a
linha do tempo das comunicações no Brasil:
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