Estudo da
ONU aponta influência humana em eventos climáticos extremos
Relatório
teve participação de cientistas e pesquisadores de 66 países
Publicado em
10/08/2021 - 18:39 Por Cristina Indio do Brasil - Repórter da Agência Brasil -
Rio de Janeiro
O relatório do
Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) da Organização das
Nações Unidas (ONU) traz um dos mais fortes trabalhos já produzidos pelo
organismo, sobretudo por associar a influência humana aos eventos climáticos
extremos, que, caracterizados com muita propriedade em alguns casos, não
existiriam sem a participação humana, como é o caso das ondas de calor, das
fortes chuvas e das secas. A avaliação é da professora titular aposentada do
Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) Thelma Krug,
atual.vice-presidente do IPCC e ex-diretora do Departamento de Políticas de
Combate ao Desmatamento do Ministério do Meio Ambiente.
O estudo foi
divulgado nesta segunda-feira (9) e vai ser complementado em 2022.
Segundo
Thelma, é indiscutível a influência humana no sistema climático como um todo, e
o relatório da ONU traz com muito mais robustez processos mais refinados, dados
cada vez melhores, a resposta climática às emissões. “Isso fica muito bem
caracterizado. É uma mensagem científica muito clara, e tenho certeza de que
essas mensagens, que foram todas aprovadas por consenso na reunião do IPCC na
semana passada, terão reflexo no IPCC como um todo, e esperamos que reverberem
no mundo político”, disse Thelma, ao participar nesta terça-feira (10) do
webinário O Brasil e as Mudanças Climáticas: o novo relatório do IPCC,
organizado pela Academia Brasileira de Ciência (ABC) e que teve transmissão
pelo YouTube.
No encontro,
foram apresentadas as principais conclusões do Grupo de Trabalho I do Sexto
Relatório de Avaliação do IPCC sobre as bases físicas das mudanças do clima.
Também participaram do evento o professor de física da Universidade de São
Paulo (USP) Paulo Artuxo; o pesquisador sênior do Centro Nacional de
Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais do Ministério da Ciência,
Tecnologia e Inovações José Marengo e o pesquisador do Inpe Lincoln Alves, que
trabalharam no ciclo do IPCC que resultou no relatório, que dará a direção
científica da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP-26),
em novembro, em Glasgow, na Escócia.
Segundo
Thelma, o painel teve participação de 234 autores de 66 países e apoio de 36
editores de revisão. Eles asseguram que todos os comentários entregues pelos
governos e minutas de relatórios sejam avaliados um a um para evitar que não
haja nenhuma tendência nas respostas. Também foi feita uma consulta a 14 mil
artigos científicos. Segundo a professora, o IPCC não elabora pesquisas, mas
avalia publicações relevantes sobre o tema em todo o mundo. Antes de ser
divulgada a última versão, é feita uma revisão em duas minutas do texto.
A pesquisadora
destacou o interesse dos governos em que os cientistas entendam as necessidades
de cada um para facilitar a tomada de decisões, especialmente no fórum mais
político,que seria a Convenção Quadro das Nações sobre a Mudança do Clima. “Os
relatórios do IPCC têm tido papel importante na ponte entre a ciência e a
política, desde o relatório 1, que ajudou no estabelecimento da Convenção do
Clima em 1992 na Rio 92.”
O Brasil é um
dos 195 países-membros do IPCC, cuja estrutura é dividida em três grupos de
trabalho. O Grupo 1,que elaborou o relatório divulgado ontem (9), tem foco na
base da ciência física do clima; o Grupo 2, que trata dos impactos, adaptações
e vulnerabilidade, apresentará um relatório em fevereiro de 2022; e o Grupo 3,
que avalia a mitigação das mudanças do clima, deve divulgar seu e trabalho em
março de 2022.
“Enquanto o
Grupo 2 tem a relevância de mostrar muitos impactos não só globais, mas também
regionalizados, o 3 foca mais no que se pode fazer para limitar o aquecimento”,
afirmou Thelma, ao ressaltar que o IPCC tem uma força-tarefa que cuida da
elaboração dos manuais metodológicos para os inventários nacionais de gases de
efeito estufa usados por todos os países integrantes.
Linguagem
incisiva
O professor
Paulo Artaxo destacou a linguagem mais incisiva deste relatório em relação aos
trabalhos anteriores e lembrou que mudanças recentes ocorridas no clima são
generalizadas e rápidas. “Nosso papel de mudança no clima é absolutamente
inequívoco e sem precedentes nos últimos 6.500 anos. O relatório também coloca
recados para os tomadores de decisão. O IPCC não faz política, não é
responsável pela redução de emissões, mas manda mensagens científicas, e a
mensagem é que, a menos que haja reduções imediatas rápidas e em grande escala
nas emissões de gases de efeito estufa, limitar o aquecimento em 1,5 grau pode
ser impossível.”
Artaxo
destacou que essa é a voz da ciência, que coloca em uma situação quase
emergencial a necessidade de redução das emissões.
Ele
acrescentou que, conforme cenários analisados, a Amazônia pode se tornar fonte
de carbono para a atmosfera global, se houver uma redução muito significativa
da absorção de carbono da Floresta Amazônica causada pelo aumento da
temperatura e redução das precipitações.
Aquecimento
De acordo com
o pesquisador José Marengo, o aquecimento global não pode ser explicado somente
por fatores naturais, o que ficou mais evidente desde 1980.
Isso ocorre
também com os eventos extremos de chuva. “Assim como a temperatura, os extremos
mostram que o efeito humano é nítido, claro, e é responsável por explicar
melhor as tendências observadas particularmente nos últimos 20 anos.”
Lincoln Alves,
do Inpe, que analisou características regionais no Atlas interativo do IPCC, apontou
o aumento significativo de eventos extremos, seja de secas, seja de
precipitações.
“As projeções
indicam que cada 0,5 grau adicional de aquecimento causa de fato aumentos
claros e perceptíveis na intensidade dos eventos de precipitação, bem como nas
secas que temos observado em várias regiões do país”, acrescentou.
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