Guterres pede
cooperação e diz que mundo nunca enfrentou tanta ameaça
Secretário
abriu assembleia geral com mais de 100 chefes de Estado
Publicado em 21/09/2021 -
13:01 Por RTP - Nova York
O secretário-geral da
Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, afirmou hoje (21) que o
mundo nunca enfrentou tantas ameaças, como destruição da paz, desconfiança ou
alterações climáticas e pediu cooperação entre os países presentes à abertura
da assembleia geral da ONU.
Um dos pontos mais altos
para a diplomacia internacional, a assembleia começou em Nova Iorque com o
discurso de Guterres, na presença de mais de 100 chefes de Estado e de Governo
e representações diplomáticas de todos os 193 Estados-membros da organização.
Segundo o secretário-geral
da ONU, "o mundo nunca esteve tão ameaçado", com seis grandes temas
de divisão: assalto à paz em todo o mundo, alterações climáticas, fosso entre
ricos e pobres, desigualdade de gênero, divisão tecnológica ou digital e
divisão geracional.
Grande parte dos problemas
advém da decorrente pandemia de covid-19, que tem criado e exagerado as
desigualdades sociais e econômicas no mundo, mas o secretário-geral destacou
outra "doença contagiosa": a desconfiança em vários níveis - sejam as teorias da conspiração
que entram em contradição com a ciência, a população sem confiança nos seus
governos ou ainda a falta de cooperação entre países em temas que
necessariamente dependem do multilateralismo.
Guterres classificou como
"obscenidade" e grande "falha ética" global o fato de as
vacinas não serem distribuídas de forma uniforme no mundo, devido à
"tragédia de falta de vontade política e egoísmo".
"Em vez do caminho da
solidariedade, estamos num caminho sem fim para a destruição", lamentou
Guterres, que também declarou que a "interdependência tem de ser a lógica
do século 21".
O chefe da ONU lembrou aos
líderes que "as promessas não valem nada se as pessoas não virem os
resultados no seu dia a dia" e, pelo contrário, se depararem com violações
dos direitos humanos, corrupção ou um futuro sem grandes oportunidades.
Os "impulsos mais
obscuros da humanidade" surgem com essa constante falta de resultados para
uma situação com mais esperança, considerou Guterres.
A defesa da
"supremacia cultural, do domínio ideológico, da misoginia violenta ou dos
ataques aos mais vulneráveis, incluindo refugiados e migrantes".
O ex-primeiro-ministro
português destacou que a paz e o respeito pelos direitos humanos estão faltando
nos mais graves casos, como o do Afeganistão, da Etiópia, de Myanmar, do Sahel,
Iêmen, da Líbia, Síria e ainda do Haiti, e muitos outros locais onde
"tantos foram deixados para trás".
Outra das grandes
preocupações internacionais é a divisão que se cria entre dois grandes poderes,
um tema que, apesar de Guterres não nomear, é recorrente nos discursos dos
últimos anos -- Estados Unidos e China podem criar um problema "muito
menos previsível e muito mais perigoso do que a Guerra Fria", disse o
secretário-geral.
"Temo que o nosso
mundo esteja a se arrastar para dois conjuntos diferentes de regras econômicas,
comerciais, financeiras e tecnológicas, duas abordagens divergentes no
desenvolvimento da inteligência artificial - e, em última análise, duas
estratégias militares e geopolíticas diferentes", acrescentou..
Em nível de alterações
climáticas, Guterres lembrou muitos dos apelos já conhecidos, como a transição
para energias renováveis, redução da utilização dos combustíveis fósseis e
carvão, mais impostos e menos subsídios sobre recursos naturais poluentes.
A grande diferença
económica entre Estados é visível como efeito da pandemia de covid-19, agora
que "as economias avançadas estão a investir quase 28% do seu Produto
Interno Bruto na recuperação econômica", uma média que cai para 6,5% nos
países de renda média e "para 1,8% nos países menos desenvolvidos",
disse o secretário.
As previsões do Fundo
Monetário Internacional indicam que nos próximos cinco anos o crescimento
económico per capita na África subsaariana seja 75% menor do que no resto do
mundo.
No discurso, Guterres
renovou o apelo para a reforma da arquitetura da dívida internacional, que a
torne mais equitativa, e para a reforma dos sistemas de impostos em todo o
mundo, para prevenir evasão fiscal, lavagem de dinheiro ou outros fluxos
financeiros ilícitos.
Ele lembrou também os
efeitos negativos da desigualdade de gênero e apelou por sociedades com
"representação mais igual", que são, consequentemente, "mais
estáveis e pacíficas".
"A igualdade das
mulheres é essencialmente uma questão de poder. Devemos transformar
urgentemente o nosso mundo, dominado pelos homens, e mudar o equilíbrio de
poder, para resolver os problemas mais desafiadores de nossa época",
considerou o ex-alto comissário das Nações Unidas para Refugiados.
O acesso à internet tem de
se tornar um direito humano, defendeu Guterres. Ele afirmou que até 2030 todo o
mundo deveria estar ligado à internet, mas com estratégias para combater o
armazenamento de dados pessoais que estão sendo usados comercialmente para
lucros corporativos, ou ainda pelos governos para "controlar ou manipular
comportamentos, violando direitos individuais ou de grupo e debilitando
democracias".
Para as cerca de 11
bilhões de pessoas que se estima que deverão nascer até o fim do século, são
necessários mecanismos para dar mais voz aos jovens, para garantir educação de
qualidade e para dar mais poder àqueles que serão herdeiros do mundo de hoje.
A esperança ainda existe,
mas necessita que "todos façam a sua parte" sem demora, com
cooperação global e um multilateralismo renovado, concluiu o secretário.
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