Texto I
[...] já foi o tempo em que via a
convivência como viável, só exigindo deste bem comum, piedosamente, o meu
quinhão, já foi o tempo em que consentia num contrato, deixando muitas coisas
de fora sem ceder contudo no que me era vital, já foi o tempo em que reconhecia
a existência escandalosa de imaginados valores, coluna vertebral de toda
‘ordem’; mas não tive sequer o sopro necessário, e, negado o respiro, me foi
imposto o sufoco; é esta consciência que me libera, é ela hoje que me empurra,
são outras agora minhas preocupações, é hoje outro o meu universo de problemas;
num mundo estapafúrdio — definitivamente fora de foco — cedo ou tarde tudo
acaba se reduzindo a um ponto de vista, e você que vive paparicando as ciências
humanas, sem suspeita que paparica uma piada: impossível ordenar o mundo dos
valores, ninguém arruma a casa do capeta; me recuso pois a pensar naquilo em
que não mais acredito, seja o amor, a amizade, a família, a igreja, a humanidade;
me lixo com tudo isso! me apavora ainda a existência, mas não tenho medo de
ficar sozinho, foi conscientemente que escolhi o exílio, me bastando hoje o
cinismo dos grandes indiferentes [...].
(NASSAR, R. Um copo de cólera. São Paulo:
Companhia das Letras, 1992)
Texto II
Raduan Nassar lançou a novela Um Copo de
Cólera em 1978, fervilhante narrativa de um confronto verbal entre amantes, em
que a fúria das palavras cortantes se estilhaçava no ar. O embate conjugal
ecoava o autoritário discurso do poder e da submissão de um Brasil que vivia
sob o jugo da ditadura militar.
(COMODO, R. Um silêncio inquietante.
IstoÉ. Disponível em: http://www.terra.com.br. Acesso:15.07.09)
Na
novela Um Copo de Cólera, o autor lança mão de recursos estilísticos e
expressivos típicos da literatura produzida na década de 70 do século passado
no Brasil, que, nas palavras do crítico Antonio Candido, aliam “vanguarda
estética e amargura política”. Com relação à temática abordada e à concepção
narrativa da novela, o texto I:
A) é
escrito em terceira pessoa, com narrador onisciente, apresentando a disputa
entre um homem e uma mulher em linguagem sóbria, condizente com a seriedade da
temática político-social do período da ditadura militar.
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