Texto
I
Principiei
a leitura de má vontade. E logo emperrei na história de um menino vadio que,
dirigindo-se à escola, se retardava a conversar com os passarinhos e recebia
deles opiniões sisudas e bons conselhos. Em seguida vinham outros irracionais,
do mesmo modo bem-intencionados e bem falantes. Havia a moscazinha que morava
na parede de uma chaminé e voava à toa, desobedecendo às ordens maternas, e
tanto voou que afinal caiu no fogo. Esses contos me intrigaram com o [livro]
Barão de Macaúbas. Infelizmente um doutor, utilizando bichinhos, impunha-nos a
linguagem dos doutores. — Queres tu brincar comigo? O passarinho, no galho,
respondia com preceito e moral, e a mosca usava adjetivos colhidos no
dicionário. A figura do barão manchava o frontispício do livro, e a gente
percebia que era dele o pedantismo atribuído à mosca e ao passarinho. Ridículo
um indivíduo hirsuto e grave, doutor e barão, pipilar conselhos, zumbir
admoestações.
(RAMOS,
G. Infância. Rio de Janeiro: Record, 1986)
Texto
II
Dado
que a literatura, como a vida, ensina na medida em que atua com toda sua gama,
é artificial querer que ela funcione como os manuais de virtude e boa conduta.
E a sociedade não pode senão escolher o que em cada momento lhe parece adaptado
aos seus fins, enfrentando ainda assim os mais curiosos paradoxos, pois mesmo
as obras consideradas indispensáveis para a formação do moço trazem
frequentemente o que as convenções desejariam banir. Aliás, essa espécie de
inevitável contrabando é um dos meios porque o jovem entra em contato com
realidades que se tenciona escamotear-lhe.
(CANDIDO,
A. A literatura e a formação do homem. Duas Cidades. São Paulo: Ed. 34, 2002)
Os
dois textos acima, com enfoques diferentes, abordam um mesmo problema, que se
refere, simultaneamente, ao campo literário e ao social. Considerando-se a
relação entre os dois textos, verifica-se que eles têm em comum o fato de que:
A)
tratam do mesmo tema, embora com opiniões divergentes, expressas no primeiro
texto por meio da ficção e, no segundo, por análise sociológica.
0 Comentários