Aula 1
Objetivo da aula: sensibilização dos estudantes sobre o tema da
sequência didática.
- Prepare-se
para fazer uma leitura clara e precisa do conto, condizente com a sua
narrativa. É importante lê-lo algumas vezes antes da aula como preparação.
Considere duas leituras completas do texto: uma logo no início da aula e a
outra ao final, após as explicações e discussões.
- Antes da leitura,
conte um pouco sobre Josué de Castro e seu texto: o conto foi escrito durante a
juventude (por volta dos 17 anos) do autor, que, com base nele, escreveu, já
com 59 anos, o romance Homens e
Caranguejos. Formou-se em medicina, especializou-se na problemática da
nutrição e, mais precisamente, na questão da fome. Argumentou que a fome era um
problema gerado por questões sociais e políticas, e não por causas naturais.
Seus trabalhos mais conhecidos são: Geografia
da Fome (1946), sobre a fome no Brasil, e Geopolítica da Fome (1951), sobre a fome no mundo.
A família Silva mora
nos ”mangues” da cidade do Recife, num ”mocambo” que o chefe da família fêz
quando chegou de cima.
A família é originária
do sertão. Desceu do Cariri, na sêca, perseguida pela fome. Fêz uma paradinha
no brejo, para tentar o trabalho das usinas, mas não se pôde aguentar com os
salários dessa zona, sem ter o direito a plantar senão cana. Sem ter, nem ao
menos o recurso do xiquexique e da macambira, como no sertão, para quando a
fome apertasse.
Nesse tempo espalharam
pelo interior um boato que o govêrno tinha criado um ministério para defender
os interesses do trabalhador e que com os fiscais da lei, a vida na cidade
estava uma beleza, trabalhador ganhando tanto que dava para comer até matar a
fome. A família Silva ouviu esta história acreditou piamente e resolveu descer
para a cidade, para gozar das vantagens que o governo bom oferecia aos pobres.
Logo de chegada a
família viu que a coisa era outra. Não havia dúvida que a cidade era bonita,
com tanto palácio e as ruas fervilhando de automóvel. Mas vida do operário,
apertada como sempre. Muita coisa p’rôs olhos, pouca coisa p’rá barriga.
O caboclo Zé Luís da
Silva não quis desanimar. Adaptou-se: “Quem não tem remédio remediado está”.
Entrou na luta da cidade com tôdas as fôrças de que dispunha, mas as forças
dêle não rendiam que desse para a família viver com casa, roupa e comida. Casa
só de 80 mil réis para cima, para comida uns 150 e os salários sem passarem de
5 mil réis por dia.
Começou o arrôcho. Só
havia uma maneira de desapertar: era cair no mangue. No mangue não se paga
casa, come-se caranguejo e anda-se quase nu. O mangue é um paraíso. Sem o
côr-de-rosa e o azul do paraíso celeste, mas com as côres negras da lama,
paraíso dos caranguejos.
No mangue o terreno não
é de ninguém. É da maré. Quando ela enche, se estria e se espreguiça, alaga a
terra tôda, mas quando ela baixa e se encolhe, deixa descobertos os calombos
mais altos. Num dêles, o caboclo Zé Luís levantou o seu mocambo. As paredes de
varas de mangue e lama amassada. A coberta de palha, capim sêco e outros
materiais que o monturo fornece. Tudo de graça encontrado ali mesmo numa bruta
camaradagem com a natureza. O mangue é um camaradão. Dá tudo, casa e comida:
mocambo e caranguejo.
Agora, quando o caboclo
sai de manhã para o trabalho, já o resto da família cai no mundo. Os meninos
vão pulando do jirau, abrindo a porta e caindo no mangue. Lavam as ramelas dos
olhos com a água barrenta, fazem porcaria e pipi, ali mesmo, depois enterram os
braços de lama a dentro para pegar caranguejos. Com as pernas e os braços
atolados na lama, a família Silva está com a vida garantida. Zé Luís vai para o
trabalho sossegado, porque deixa a família dentro da própria comida, atolada na
lama fervilhante de caranguejos e siris.
Os mangues do
Capibaribe são o paraíso do caranguejo. Se a terra foi feita p'rô homem, com
tudo para bem servi-lo, também o mangue foi feito especialmente p'rô
caranguejo. Tudo aí, é, foi ou está para ser caranguejo, inclusive a lama e o
homem que vive nela. A lama misturada com urina, excremento e outros resíduos
que a maré traz, quando ainda não é caranguejo, vai ser. O caranguejo nasce
dela, vive dela. Cresce comendo lama, engordando com as porcarias dela, fazendo
com lama a carninha branca de suas patas e a geléia esverdeada de suas vísceras
pegajosas. Por outro lado o povo daí vive de pegar caranguejo,
chupar-lhe as patas, comer e lamber os seus cascos até que fiquem limpos como
um copo. E com a sua carne feita de lama fazer a carne do seu corpo e a cerne
do corpo de seus filhos. São cem mil indivíduos, cem mil cidadãos feitos de
carne de caranguejo. O que o organismo rejeita, volta como detrito, para a lama
do mangue, para virar caranguejo outra vez.
Nesta placidez de
charco, identificada, unificada no ciclo do caranguejo, a família Silva vai
vivendo, com a sua vida solucionada, como uma das etapas do ciclo maravilhoso.
Cada elemento da família marcha dentro dêsse ciclo até o fim, até o dia de sua
morte.
Nesse dia os vizinhos
piedosos levarão aquela lama que deixou de viver, dentro dum caixão p'rô
cemitério de Santo Amaro, onde ela seguirá as etapas do verme e da flor. Etapas
demasiado poéticas, cheias duma poesia que o mangue não comportaria. Parte-se
aparentemente, nesse dia, o ciclo do caranguejo, mas os parentes que ficam,
derramam caridosos as suas lágrimas no mangue para alimentar a lama que
alimenta o ciclo do caranguejo"
CASTRO, Josué de. Documentário do Nordeste. 2. ed. São
Paulo: Brasiliense, 1959, p. 25-28.
Explique a questão
histórica da região do "polígono das secas".
-
O que é o “brejo” e a quais usinas o texto faz referência?
Caracterize as
subregiões nordestinas, mais precisamente o agreste e a zona da mata, e
explique a presença das usinas de cana-de-açúcar na região.
-
A cidade era ruim para todos os habitantes?
Explique as
desigualdades socioespaciais e a exclusão social.
-
Havia saneamento básico na área habitada dos manguezais?
Explique que não e
destaque o trecho do texto que faz referência ao mangue servir como um
banheiro, tanto para fazer as necessidades fisiológicas como para lavar o rosto
ao acordar.
·
Ao
final da aula, após as discussões e explicações, realize a segunda leitura do
texto.
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